25/05/2016

O VERDADEIRO ATIVISMO E A PERVERSÃO DAS "REDES"

As redes sociais ditas alternativas estão invadidas pela desinformação, tornando-as em espaços muito mais favoráveis ao sistema que aos que se lhe opõem - por estranho que pareça.

O post seguinte num grupo do Facebook é apenas um dos muitos exemplos.


O post foca a aquisição da Monsanto pelo grupo Bayer e foi publicado sob a interrogação: "Fim duma das empresas mais odiadas do mundo?"

É o tipo de post que caracteriza a incultura política e económico-social prevalecente nas chamadas redes sociais.

Obviamente, a Bayer em nada é melhor que a Monsanto e os seus produtos são no essencial os mesmos: os pesticidas e outros que alimentam o monstro do agrotóxico, que neste momento DOMINA QUASE POR COMPLETO a agricultura que se pratica a nível planetário.

NECESSÁRIO REPENSAR O PAPEL DAS "REDES SOCIAIS" 
E RESPECTIVOS GRUPOS

Temos todos que repensar o nosso papel perante as chamadas redes sociais.

Que podem ser sociais mas apenas na medida em que  fazem socialização, tal como uma festa de antigos alunos, um festival de pornografia ou um encontro de adoradores de ratinhos amestrados - ou de cães e gatos, dá igual - todos são "redes sociais" ou grupos - cada um mais inútil e confuso no conteúdo que o anterior.
Estas "redes sociais" do tipo Facebook, Twitter, Whatsapp, etc. formam grupos aleatórios de pessoas, onde muitas delas sequer se conhecem mas têm em comum a ilusão de transformar algo através da troca de informações na rede.

Informações colhidas e replicadas de forma mais ou menos caótica, em que as fontes raramente são citadas (e na maioria são duvidosas), informações que não resultam geralmente de nenhuma reflexão pessoal séria sobre o tema.

Além disso, estas redes têm o papel extremamente negativo de anular as análises corretas - estou a pensar num post sobre a indústria alimentar que coloquei num grupo e que passados poucos minutos já estava empurrado lá para trás, a seguir a uma série de entulho, muito dele de vários "profissionais" da desinformação de plantão constante nos grupos mais frequentados.

"Profissionais" que, alguns deles pelo menos, têm por finalidade despejar nas redes todo o tipo de confusionismo fazendo-o passar por "progressista" e até por "crítico do sistema" (
por exemplo, podem falar mal da Monsanto ou dos bancos, ou apontar um qualquer caso de corrupção ou de privilégio, mas sempre  de forma isolada como epifenomenos fora do SISTEMA, caídos do céu aos trambolhões). 

logo a seguir - eventualmente com um "perfil falso", já que o mesmo indivíduo ainda por cima pode desmultiplicar-se anonimamente com diversos perfis ou nomes - desencadear um ataque traiçoeiro ao ativista que luta a sério contra o sistema, revelando - o que só é perceptível para quem 'está por dentro' - que não anda ali para agir contra o sistema mas para protegê-lo e reforçá-lo.

Quem ataca os do seu campo não é apenas um falso amigo. É o nosso pior inimigo, ao fazer-se passar por companheiro e na primeira oportunidade nos atacar pelas costas.

O objectivo desses profissionais da desinformação é encher chouriços, através de propaganda-lixo ou falsa crítica ao sistema, métodos muito eficazes para baralhar os menos informados, que no fundo serão 99,9% das pessoas.

Nem doutra forma podia ser, 


Com a informação geral filtrada pelos media do sistema e o próprio  sistema social caracterizado hoje  por uma extrema complexidade, a par da grande flexibilidade e de estratégias multifacetadas de manipulação que lhe permitem integrar até parte dos descontentes, seja pela ilusão e alienação, seja pela imposição.


AS 'REDES' TORNARAM-SE PERVERSAS


A mesma pessoa da sua rede que lhe manda  um excelente vídeo sobre o monstro da indústria alimentar tóxica, logo a seguir pode mandar-lhe um outro "muito humanista" sobre a Venezuela que mais não é que propaganda infecta com a perspectiva do "império do dólar" sobre o tema - e muito eficaz porque é um vídeo com uma "jovem inocente" a clamar "pela paz" e "contra a feroz repressão" aos que "apenas pedem o fim da fome". 

Então começamos a perceber melhor para que servem as "redes sociais".

Os que estrangularam a Venezuela, a Nigéria ou o Brasil pelo esmagamento do preço do petróleo bruto e outras commodities, são os mesmos por detrás das "manifestações de gente inocente", os mesmos que dominam a indústria tóxica alimentar global. E os mesmos que dominam a informação a nível global.

Como pode não se entender que ser contra uma Venezuela social e patriótica - por muito que não nos identifiquemos com o populismo chavista versão Maduro - é estar a favor do 
monstruoso sistema alimentar tóxico, o mesmo sistema que manipula a informação, o mesmo que nos "obriga" a focar o que lhe interessa, em vez do que é realmente importante?

Parece difícil alguém não saber interpretar desta maneira. 


Mas a verdade é que poucos o conseguem.

Para isso, os media e outros agentes usam todo o tipo de manipulação. 

Como a ilustrada pela metáfora abaixo.


DISCUTIR A CASA OU O MÓVEL DA CASA?
Se você quisesse que o estado duma casa podre (em 2º plano, na figura) não fosse discutido, bastaria meter à frente por exemplo um móvel, e convencer o público que o importante é discutir esse móvel. 
Por estranho que pareça, desde que seja bem feito, a maioria das pessoas cai no truque.

ESTARÁ O SISTEMA MAIS FRACO?

Comecemos por assumir que: 

- Quem acha que o combate ao sistema é coisa fácil e que tudo se resume a uma propaganda nas redes... 
- Quem acha que o sistema é "tolerante"  ao ponto de oferecer - e gratuitamente! - os instrumentos que permitem ao simples "cidadão" combatê-lo...
... Esse sofre dum ilusionismo típico dos instalados. 

No fundo, subconscientemente, assumiu os valores do sistema e limita-se a calar a sua má-consciência (ou colaboracionismo...) seja através duma propaganda tremendista caricatural tipo tudo-ou-nada completamente ineficaz, seja através da crítica a aspectos isolados do sistema, como demonstro acima.

Mas na realidade o combate ao sistema implica não cultivar ilusões de facilidade.

Hoje, o sistema capitalista está mais forte do que nunca. 

Apesar da crise permanente em que vive e da desmultiplicação de novos pólos capitalistas, o grande poder financeiro continua intacto e concentrado nos mesmos protagonistas centrais de sempre.

Aparentemente organizados de forma mafiosa e mais articulada que nunca, com um controle fortissimo não só do capital, mas também a nível informativo e cultural através de centrais de intoxicação organizadas, o que se prova com estas próprias redes tecnológicas controladas (pelo menos formalmente) por empresas globais, que se dão ao luxo de facultar uma "ampla liberdade de acesso" sem que o sistema saia minimamente beliscado.

Pelo contrário, as redes informativas têm servido para o sistema dominar novas regiões e países que não controlava antes - caso das primaveras árabes convocadas via facebook e SMS, que criaram uma base social de protestos que permitiram ao imperialismo a destruição da Líbia, a retomada do Egito e da Tunísia por esbirros seus, e a brutal agressão que destruiu a Síria e provocou uma debandada maciça da sua população para a Europa, colocando mesmo esta, 
agora, ante um futuro imprevisível e preocupante.


COMO COMBATER O SISTEMA


Talvez uma das primeiras condições seja a de cada um cultivar uma qualidade essencial mas cada vez menos praticada: a humildade, a modéstia, e pôr o interesse colectivo e geral antes do individual e particular.

Tanto mais que o contrário nos é constantemente induzido: este sistema vive do culto do individualismo, da exibição e da vaidade. A forma como as pessoas se comportam nas redes sociais, o narcisismo de "postar a última foto" no facebook, a mania de ter opinião sobre tudo, mesmo aquilo que nunca se estudou nem conhece, assim como postar "aquele post" com a última-informação-que-vai-salvar-o-planeta, tudo isso não são mais que manifestações de narcisismo doentio e puro individualismo.

A atitude do verdadeiro ativista contra o sistema tem de ser o oposto. 

Cultivar a modéstia, não se armar em perito de tudo-e-mais-alguma-coisa, nem em líder barato dum grupinho de inúteis da internet. Mais um grupo que não serve rigorosamente para nada, a não ser para criar novas ilusões ao fingir que faz alguma coisa de útil.

O verdadeiro ativista não promove ideias fáceis e da moda, nem usa sistematicamente a informaç
ão passada pelos media do sistema. Quando o faz por necessidades práticas, deve fazê-lo num contexto do combate ao sistema, não valorizando a notícia da SIC, da RTP ou do Público e do DN em si mesma, enquanto fonte primária de informação fiável, . mas apenas como um instrumento ocasional e pontual, para ancorar uma opinião própria que o ativista formou a partir de outras fontes mais fiáveis.

O verdadeiro ativista não se ilude com a importância das redes sociais, nem com o potencial revolucionário dos que nelas participam. 

As pessoas que estão num grupo em rede são as mesmas que você encontra no café, no restaurante ou no emprego. Porque haviam de ser diferentes? Apenas porque não está a vê-las e porque emitem umas frases fanfarronas, de quem está protegido pela distância ou o anonimato? Haja bom-senso...

verdadeiro ativista compreende que a fase em que estamos é de profunda desorganização do movimento popular, seja a nível global, seja nacional, dominado que está por partidos e grupos imbuídos duma cultura servil ao sistema, incapazes de o desmontar justamente porque também estão instalados nele.

Mas o verdadeiro ativista, apesar disso, não igualiza as forças políticas, nem transmite a mensagem falsa (e grave) de que esquerda e direita, "os políticos" em geral são todos exatamente o mesmo, e que levam todos ao mesmo resultado. 

Nem nos EUA - centro do sistema - isso é verdade. Quanto mais em Portugal, na Europa, na América Latina ou noutros locais da periferia do sistema.

O verdadeiro ativista não serve os direitos e valores de minorias ativas e agressivas contra a maioria da população. Nem cultiva valores "humanistóides" como a "liberdade" ou a "cultura" em abstrato. 

A liberdade é sempre a liberdade dum grupo determinado, e a cultura também. Não existe isso de liberdade em abstrato, nem de cultura em abstrato

Liberdade e cultura servem para defender os interesses duns grupos e indivíduos contra outros, na disputa política. 

verdadeiro ativista não se coloca de forma acéfala e idiótíca ao serviço duma ideologia, ou duma ladaínha, ou de ídolos e outros entes míticos, sejam eles históricos ou atuais, nem de países e interesses estranhos aos do seu próprio povo.

A única entidade que o verdadeiro ativista pode servir é o seu próprio povo, enquanto parte da humanidade inteira, e esta por sua vez enquanto parte integrante da natureza, do planeta e do universo, em que deve integrar-se harmoniosamente.

O exercício da política é a luta pelo poder, primeiramente no interior do sistema, que o verdadeiro ativista procura enfraquecer para o transformar num sistema novo.

Um sistema novo  onde o controle seja do povo e sirva valores de justiça, igualdade, dignidade, respeito pelos interesses coletivos e individuais, pondo os primeiros à frente dos segundos, assim como da liberdade e da cultura - então sim para a maioria da população, numa primeira fase, e para todos num futuro que nem deve ser longínquo. 

O verdadeiro ativista percebe que a maioria das pessoas - por razões de consciência e de pulsão - não tem potencial revolucionário no sentido de ser organizada imediatamente como vanguarda.

Independentemente de numa fase mais avançada essa maioria poder e dever ser mobilizada para o processo de transformação social.

É muito provável que na atual fase de confusão ideológica e de incapacidade para compreender o sistema - e como ele se configura agora  -, apenas uma em cada mil pessoas (na melhor das hipóteses) tenha esse potencial. 

Isso não deve dar ao ativista nenhum sentimento de arrogância ou de "super-homem". 

Pelo contrário, deve torná-lo muito humilde e fazê-lo preocupar-se ante a imensidão das tarefas a cumprir no caminho para a construção dum novo sistema.

Assim, partir para o arranque (porque é essa a fase que estamos) de qualquer reorganização da vanguarda é uma tarefa extremamente difícil, cheia de resistências e de escolhos. Que o sistema tentará barrar por todas as formas ao seu alcance.

Uma tarefa que isola o verdadeiro ativista, e nomeadamente põe em risco a sua segurança pessoal a própria vida. O suficiente  para que não encare de ânimo leve o seu trabalho. 



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