24/07/2013

O (MAU) RUMO QUE AS COISAS ESTÃO A TOMAR

"Só caloteiros é que fazem eleições, gente inconsciente, sem a noção do poder dos mercados. (...) Não temos dinheiro para comprar mais democracia. Temos de ficar com esta democracia de plástico comprada na loja chinesa, com este manequim que faz de primeiro-ministro, com esta marioneta que faz de Presidente, com esta boneca de trapos que faz de oposição, com estes pés-de-microfone que fazem de jornalistas." 

- José Malheiros, na edição de hoje do Público, citado por QUE SE LIXE A TROIKA





Quem abra a televisão na RTPi e saiba ler os sinais mediáticos, fica com uma ideia cataléptica do País e do rumo que a política doméstica está a tomar.

A maior parte dos programas são estupidificantes e de baixo nível.

Uma telenovela feita para exibir meninas “bétas” todas fardadinhas, com dramas artificiais num colégio de plástico. Programas de humor diários, com ar abandalhado de riso amarelo. Concursos boçais, com o público a ser orientado para comportamentos grunhos. Quase tudo é entretenimento rasca, do tipo "Aqui Portugal" (nomes tão imaginativos...), onde locutores incultos apelam a telefonemas para prémios, em meio a catadupas de música pimba. Futebol servido em debates paranóicos e em doses insuportáveis (serviço público: Hellôoo!! Anybody there?). A própria informação regional não tem o mínimo critério, certas regiões já sobre-representadas politica e economicamente, ainda se vêem ampliadas por este media (para mais análises, ver "Crítica aos media" e "somos todos iguais, mas...).


A NOVA MANIPULAÇÃO IDEOLÓGICA

Mas os noticiários diários são os que refletem melhor o estado dissolvente e feudalizado do País. Emitidos em horário alternado entre Lisboa e o Porto, incluem os telejornais regionais das RTP Madeira e Açores após o telejornal nacional das 20 horas. Não esqueçamos que se trata da RTP-i, montra do País no mundo. Não conheço canal internacional de país nenhum que tenha esta prolixidade folclórica e falta de uniformização.

Aliás, vai-se esboçando que a uniformização e o controle estão reservados ao controle da imagem do poder executivo nacional. Eis um exemplo, extraído do telejornal 24 Horas.


Reportagem da visita de Passos Coelho a uma instituição social em Vila do Rei:

- Locutor em off: O 1º ministro foi recebido em Vila do Rei com protestos da CGTP [Nota: onde é demonstrado que era apenas a CGTP?].
- Seguem-se imagens e a fala dum manifestante: Este governo não tem legitimidade, vamos constestá-lo até ele cair.
- E imediatamente, locutor em off, sobre imagens de Coelho: Mas este é um governo que acaba de ser legitimado pelo Presidente da República.

É uma subtil, mas radical transformação do jornalismo da RTP:  na montagem das peças jornalísticas, quando a matéria afeta a imagem do governo, é interposto um elemento ideológico – imagem ou comentário descontextualizado da matéria  - que anula o efeito negativo dos factos relatados na reportagem. 


PROPAGANDA AO CAPITALISMO ESPECULATIVO

No mesmo noticiário, o comentador convidado era um “jornalista” económico, não residente daquele estúdio. Mas viu-se que a sua presença ali tinha um fim: apresentar o caso de Singapura duma forma grosseiramente manipuladora.

O homem é dos que vivem num mundo à parte, irreal. Começa por atirar que 25% da população de Singapura é milionária e que o nível de vida médio é superior à Suiça, atraindo mais capitais que esta, etc. Tudo para concluir que Singapura é um “excelente exemplo” para Portugal e terminar fazendo propaganda à “imprescindibilidade” dos mercados financeiros.

Não vou desmontar a totalidade desta propaganda grotesca, pelo menos para quem acompanha os temas (ver, no meu outro blogue, o separador 7). O que não impede verberar a solicitude ignorante do jornalista-pivô dos estúdios do Porto, particularmente lamentável dado o caráter manipulador da matéria.

Apenas referirei que:

1) Não existe comparação possível entre um país-ilha/cidade concentrando 5 milhões de habitantes urbanos em parte dos escassos 710 km2 que constituem Singapura, e um país real, histórico, como Portugal, com 10,6 milhões de pessoas dispersas por milhares de localidades urbanas e rurais em 90.000 km2 e dois arquipélagos insulares, a que acresce uma diáspora de 7 milhões.

2) Singapura é um regime autocrático, sempre governado pelo mesmo partido, com uma população multicultural e multinacional  de base 
tripla -  malaia, chinesa e indiana - tanto que adotou 4 línguas oficiais - Inglês, Malaio, Mandarim e Tamil. Situada na macroregião mais dinâmica do mundo, é a sede da APEC (associação Ásia-Pacífico-América) e foi formatada desde a independência da Inglaterra, em 1963, para fazer a charneira entre a economia fraudulenta do dólar americano e da libra esterlina, e os interesses chineses, japoneses, indianos, australianos. Concorrendo com Hong-Kong como praça financeira, Singapura tem a "vantagem", para o efeito citado, de não depender da China.

3) Portugal, país unitário com 9 séculos de continuidade, local de origem da 3ª língua do ocidente e 5ª mundial, primeiro país a abolir o assassinato e os castigos corporais estatizados, espera-se que nunca mais seja um regime autocrático, nem sede de redes mundias financeiras fraudulentas. Nem é, obviamente, um país multinacional e multilingue, estando bem longe da região de maior crescimento do mundo.


UMA ECONOMIA FRAUDULENTA DE CASINO?

Quem diz que "os mercados financeiros são vitais porque permitem às empresas financiar-se a custo zero" e argumenta com "os EUA, maior economia mundial, têm mais de 65% do financiamento das suas empresas feito nestes mercados",  diz tudo sobre a ideologia e interesses que serve. 

A verdade é outra: só grandes empresas podem montar operações de dispersão do capital em bolsa. E isso, porque os gastos com os gabinetes de advogados e sindicatos financeiros que montam as operações e com a própria operação, são muito grandes. Além disso, os países que assentam em economias reais, não-especulativas/fraudulentas, são economicamente os mais sólidos do mundo - casos da Alemanha, dos países nórdicos, da China, da Coreia ou da Austrália. Ao contrário, EUA e Reino Unido, economias de base especulativa, é com dificuldade e por meios inconfessáveis que se mantêm à tona.

Em resumo: começa a esboçar-se o caminho imaginado por esta gente (admitindo, com muito boa vontade, que eles têm algum caminho para Portugal): o de um país sem História, com um população tecnocratizada, massificada, suburbana, com umas poucas regiões elitistas num país proletarizado, sem alma nem tradição, com um regime autocrático de fachada democrática, virado para a especulação financeira e curvado às regras rígidas e burocráticas impostas pela Alemanha, por um lado, mas buscando ter um papel mesmo que marginal na colossal operação fraudulenta financeira sediada nos EUA, por outro. Operação aliás que, para prosseguir, cria a ameaça duma 3ª guerra mundial (1). 


OS ÚLTIMOS SINAIS POLÍTICOS

Não será certamente ocasional a nomeação para novo ministro dos negócios estrangeiros dum homem da confiança não só do grande capital português, como do norte-americano – apesar do documento do embaixador americano revelado pela Wikileaks, o que interessa é que Machete foi presidente da fundação luso-americana FLAD, financiada pelos EUA.

O novo ministro da Economia vem diretamente da cervejeira Unicer (empresa portuense que gosta de exclusividade nos estabelecimentos que fornece, impedindo a livre-escolha pelos consumidores), e é seguramente um homem de confiança da alta burguesia portuense, capaz pelas suas ligações de fazer a ponte com os banqueiros lisboetas. Além dele, também o outro novo membro, Moreira da Silva, provém do Porto e mais importante, da universidade da Opus Dei de Navarra, onde ambos se pós-graduaram. Dois homens que certamente sabem ouvir muito bem um certo fundamentalismo capitalista católico castelhanófilo.

Espero "ansiosamente" a reação das oposições e das centrais sindicais, mas os primeiros sinais são já reveladores.

É  o caso do novo secretário-geral da UGT, que se apressou em exprimir um chocante voto de confiança (!?) a este governo recauchutado. Por outro lado, a expressão facial e vocal do líder da CGTP, quando declarava na TV ir fazer oposição, mostrava o "entusiasmo" de quem vai levar uma injeção no traseiro. 

Sabendo-se as correias partidárias que ligam a cada uma das centrais sindicais, percebe
mos por estes retransmissores qual o jogo duplo - no caso, meramente eleiçoeiro - dos respetivos partidos, 

Os sinais são de que andam todos a brincar com a vida e os sentimentos das pessoas. É por isso que a simpatia pelos partidos é cada vez menor: as pessoas sentem que é tudo jogo político de cena.

Está visto que, se novos protagonistas populares e nacionais não aparecerem, o povo "está frito" e não vamos longe na democracia e na independência de Portugal. 

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(1) É um tema que conto desenvolver,  requerendo desmontar os estratagemas militares, económicos e políticos da única superpotência atual. Estratagemas usados para se enriquecer no passado e  para, no presente, viver muito acima da sua produção real, através da imposição do dólar como moeda  mundial, sem qualquer contrapartida real nas respetivas emissões. 

O padrão-ouro foi abandonado há muito. Os EUA anularam Bretton Woods e rejeitam qualquer supervisão internacional sobre a emissão de moeda e sobre as suas reservas em metal precioso ou garantias reais. 






  

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